CRÔNICA: Clarice, os dinossauros

23/07/2020


*Thainá Carvalho

Venho me arrastando há semanas em um livro de Clarice Lispector. Claro que eu gosto de Clarice (e se eu não gostasse, não ousaria dizê-lo), mas, às vezes, o tal alto nível me cansa. Por despeito, comecei a ler ‘O Parque dos Dinossauros’ no último fim de semana. Digo por despeito porque me ofendi com esse diálogo.

Meu marido: diga um livro pra eu ler;

Eu: leia ‘O Parque dos Dinossauros’;

Meu marido: eu não, livro besta!

Eu: NÃO EXISTE ISSO DE LIVRO BESTA. A ACADEMIA INVENTOU ISSO PRA DESLEGITIMAR MUITAS OBRAS POPULARES QUE ADQUIRIRAM SUCESSO. ESSE LIVRO É UM CLÁSSICO POR UM MOTIVO. NÃO SEJA METIDO (fui bem menos eloquente e gritei muito mais).

Meu marido: apenas diga um livro pra eu ler;

Eu: Antônio Prata (era um livro besta).

Fato é que li o livro inteiro em dois dias e ainda assisti aos dois primeiros filmes com meu marido, que deixou de ver a última temporada de ‘A Casa de Papel’ para me acompanhar. E quem pode me culpar por perder completamente o foco produtivo em detrimento de dinossauros? Certamente, não Clarice. Ela mesma afirmou, em certa crônica, que “ser intelectual é também ter cultura, e eu sou tão má leitora que, agora, já sem pudor, digo que não tenho mesmo cultura”

Também despudorada, digo que tudo que o que eu quero no final de um dia estressante é assistir Meryl Streep, em “O Diabo Veste Prada”, enquanto folheio gibis da Turma da Mônica. Com certeza comeria um miojo nesse meio, mesmo sabendo que aquela torta-de-batata-doce-fit-com-leite-de-castanha é tão melhor para a minha imunidade (no fundo, ou não tão no fundo assim, minhas estrias sabem que o que eu gosto mesmo é de gororoba).

A moral da história é que eu defino o que é minha cultura. Mas, de qualquer forma, se me perguntarem o que fiz nessa quarentena, direi que estava revisitando clássicos de Spilberg.

*

*Thainá Carvalho tem 29 anos e é formada em Comunicação Social. É criadora e editora da Revista Desvario, publicação digital sem fins lucrativos voltada à difusão da literatura contemporânea criada por mulheres. Faz parte do Coletivo Urbanas e publicou o ebook Síndromes, de prosa poética. Escreve poesias e contos porque não cabe em si de palavras, que publica no Instagram @oxente_thaina e no site www.oxentethaina.com.br , onde o texto acima foi originalmente publicado.



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