Da granja ao hotel – energia solar revigora negócios sergipanos
31/07/2024
Por Andréa Moura
O que a granja Aviboa, localizada no município de Areia Branca, no agreste sergipano, tem em comum com o Xingó Parque Hotel e Resort, um dos mais tradicionais hotéis do alto sertão sergipano, localizado em Canindé de São Francisco, para além do fato de fazerem parte de um estado cuja incidência solar ocorre por todo o ano, independentemente de ser verão ou inverno?
Essas empresas aproveitaram a abundância do sol para implantar usinas de energia solar fotovoltaicas e dessa maneira, reduzir os custos com energia elétrica, e transformar em capital de giro o dinheiro antes gasto na conta de luz.
A Aviboa e o Xingó Parque Hotel integram o universo de mais de 21 mil consumidores dessa energia limpa no estado, e que juntos fizeram Sergipe chegar, em junho de 2024, à marca de 176 megawatts de potência instalada na geração própria de energia solar, como afirma a Associação Brasileira da categoria, a ABSOLAR.
Elas também ajudaram no crescimento do setor localmente, pois no acumulado de 2012 até junho de 2024, ele proporcionou ao estado a atração de R$ 900 milhões em investimentos, geração de mais de 5,2 mil empregos e na arrecadação de R$ 300 milhões para os cofres públicos, como mostrou o levantamento da ABSOLAR.
Para exemplificar de maneira ilustrativa o que seriam esses 176 MW de potência gerada por Sergipe, o coordenador da ABSOLAR, Luzer Oliveira, afirma que eles equivalem, mais ou menos, a 320 mil painéis fotovoltaicos, o que em área seria o equivalente a 200 campos de futebol.
“Sim, é bastante coisa, e claro que esses são números bem significativos para o estado de Sergipe, mas tudo ainda pode ser melhorado, e para tanto, passa também pelo investimento de políticas públicas, tanto local quanto nacionalmente. Ampliar a quantidade de instalações fotovoltaicas é fundamental para o desenvolvimento econômico de Sergipe, e do Brasil”, declarou Luzer Oliveira.
Ele ainda ressaltou que em todos os municípios sergipanos há a presença de unidades, residenciais e/ou comerciais, utilizando energia solar.
CRÉDITO IMPULSIONA O CRESCIMENTO
Os dados da ABSOLAR são fortalecidos pelos do Banco do Nordeste em Sergipe, que nos últimos cinco anos (de 2019 a 2023), através do FNE SOL, concedeu mais de R$ 1,5 bilhão em crédito para financiamento de projetos de energia solar, beneficiando mais de 6.500 empreendimentos rurais e urbanos, como afirmou o gerente de relacionamento do Banco do Nordeste/SE, Paulo Lira.
O FNE SOL tem impulsionado a utilização de fontes renováveis, oferecendo condições facilitadas para a aquisição e instalação de sistemas de energia solar em todo o país.
Nesse período de cinco anos, somente para projetos de implantação de energia solar em residências sergipanas, foram aplicados mais de R$ 22 milhões. “São recursos que movimentam a economia local, gerando emprego e renda, sobretudo para empresas sergipanas que vendem os equipamentos e prestam o serviço de instalação dos sistemas geradores de energia fotovoltaica”, observou Paulo Lira.
E somente no primeiro semestre de 2024, a economia sergipana contou com a injeção de R$ 50,4 milhões, recursos utilizados em 446 operações para implantação de energia solar fotovoltaica, através do FNE SOL do BNB. Do total de operações realizadas, 55 foram para Pessoas Físicas e 391 para Micro e Pequenas Empresas.
Luz que aquece e faz crescer
Na Granja Aviboa, empresa sergipana fundada por João Dias, sediada no município de Areia Branca, com mais de quatro décadas de história e empregando mais de 100 pessoas, a usina de energia solar foi implantada há apenas três anos, mas a redução do valor na conta já virou história para ser contada.
Com uma produção diária de 200 mil ovos, e um plantel de 220 mil aves que precisam de recursos que envolvem o consumo de energia em todas as fases do crescimento, como o aquecimento quando pintainhas com menos de uma semana de nascidas, e na fase de produção, necessitando de 17 horas de luz, entre natural e artificial, antes da mudança de sistema, o valor pago mensalmente na conta de luz da sede, e de mais quatro unidades, ultrapassava a casa dos R$ 20 mil.
João Dias contou que com a implantação da energia solar aumentaram também as unidades beneficiadas pela energia limpa, passando de cinco para oito, mas o valor pago na conta de todas está muito abaixo dos R$ 10 mil, já tendo feito valer à pena o investimento de cerca de R$ 400 mil.
“Há cerca de seis anos sou consumidor de energia solar, mas utilizava apenas na minha residência. Há três anos foi que implantei em todas as unidades da Aviboa, e sem dúvida o resultado tem sido maravilhoso, inclusive, o dinheiro que estou economizando nas contas de energia está sendo reaplicado no negócio, em despesas correntes e que sofrem reajuste constante, como manutenção da frota e vacinação das aves”, comentou João Dias.
Além da questão econômica, o proprietário da Aviboa explanou que outros dois fatores foram primordiais para a implantação da usina fotovoltaica: a sustentabilidade, e ele ser engajado em movimentos ecológicos, inclusive, dentro da granja está a primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) registrada em Sergipe, com área aproximada de 14 hectares.
“O sol nasce pra todos,
só não sabe quem não quer”
Se lá nos idos de 1989, Renato Russo já sabia que o sol é democrático, que ele nasce para todos e que indica caminhos para os seres humanos, como ele afirmou na letra da música “Quando o sol bater na janela do teu quarto”, imagina para o sertanejo nordestino, que já nasce aprendendo a “ler o caminhar do sol no céu”. Tê-lo como aliado é mais que uma escolha, é questão de sobrevivência.
E usando dessa sabedoria nordestina e da ligação que possuem com o astro rei, foi que os responsáveis pelo Xingó Parque Hotel e Resort (XPH), localizado no município de Canindé do São Francisco, pioneiro na hotelaria no alto sertão sergipano, com 33 anos de fundação, decidiram implantar a usina de energia solar fotovoltaica.
A construção do sistema aconteceu em duas etapas, como informou o gerente geral e sócio do XPH, Felipe Pimentel Gadelha. Ele explicou que foram realizados dois projetos, com o intuito de fazer com que o valor da conta de energia fosse reduzido o máximo possível. Uma implantação aconteceu em novembro de 2022 e a outra em setembro de 2023, investimentos realizados com o apoio do Banco do Nordeste, que foi o agente financiador.
E por não se tratar de um investimento com recursos próprios, mas sim com o auxílio de uma instituição financeira, Felipe Gadelha comenta que, basicamente, o que gastaria para pagar a energia consumida está sendo convertido para honrar o compromisso, e que a conta de energia do XPH, que antes era próxima dos R$ 20 mil, agora está entre R$ 2 mil e R$ 3 mil.
“Zerar a fatura infelizmente não é possível, mas ter uma redução entre 80 e 90% é, além de ser muito viável. Hoje não sinto uma mudança enorme de economia, pois como disse, essa economia está sendo redirecionada para as parcelas, mas a médio e longo prazo ela aparecerá com mais evidência”, detalhou o sócio do XPH.
Outra vantagem citada por Felipe Gadelha foi a de o financiamento possuir parcela fixa, e como a energia tende a aumentar, as parcelas do financiamento tendem a cair. A potência média mensal consumida da usina fotovoltaica do XPH é de aproximadamente 20Mwatts/mês.
Ao contrário do que se tem no ideário de muitas pessoas, especialmente das que não conhecem o sertão nordestino, o sol intenso não seria um castigo, mas de acordo com Felipe Gadelha, um impulsionador do desenvolvimento para aqueles que souberem aproveitar o potencial por ele oferecido.
“Entretanto, falando especificamente da nossa região, esse ano foi bastante chuvoso e nublado, diminuindo consideravelmente a produção de energia solar. Mas como tudo na vida passa, esse tempo atípico passará e o sol virá nós contemplar com seu brilho”, finalizou o empresário.
SOBRE O XPH
O Xingó Parque Hotel e Resort é uma empresa familiar, passada de pai para filha, e neto. A construção foi iniciada em 1989 e as obras finalizaram em 1991. Localizado bem pertinho do Velho Chico, distante cerca de quatro quilômetros da orla de Canindé de São Francisco, o hotel possui 60 apartamentos, com capacidade de até 145 leitos, e 49 funcionários.
Shopping ganha certificação por energia limpa
Inaugurado em novembro de 1997, o Shopping Jardins, o primeiro centro de compras da capital sergipana, desde 2019 possui Certificação Internacional de Energia Renovável (I-REC), comprovando que o local utiliza energia limpa, proveniente de diferentes fontes renováveis, mas principalmente da eólica e da energia solar, para abastecer praticamente todo o empreendimento, que é composto por 194 lojas, área play e lazer, e nove salas de cinema, tudo isso distribuído em uma área bruta locável de 49.455 m².
De acordo com as informações passadas pela Assessoria de Imprensa do local, além da economia financeira em torno de 13,5%, o principal benefício do uso de energia limpa pelo centro de compras é a preservação dos recursos naturais.
“A energia solar chegou para ficar”
Um dos benefícios que a ABSOLAR sempre destaca, ao falar sobre o setor de energia solar fotovoltaica, é o de fortalecimento da cadeia produtiva, com o surgimento de novas empresas e a geração de emprego e renda para o país. E em Sergipe, um dos exemplos que podem ser citados é o da Inovar Eletros, empresa fundada em 2021, mas cuja origem foi com a Ions Eletros, há nove anos, e que está sediada no município de Itabaiana, agreste sergipano.
De acordo com o idealizador e diretor da empresa, José Arnaldo Nascimento Júnior, a motivação para encarar o desafio de trabalhar com energias renováveis foi a ampla oportunidade de crescimento e potencial do mercado. Conheça um pouco da Inovar:
PRA VOCÊ SABER – Por que entrar nesse mercado?
JOSÉ ARNALDO NASCIMENTO JÚNIOR - Foi perceptível para nós, que essa é uma área que abre muitos campos, e o quanto poderíamos evoluir no mercado, não apenas no sergipano, mas nacionalmente. Assim, ainda que sejamos uma empresa totalmente sergipana, já atendemos grande parte do Nordeste. A Inovar leva para a vida de cada cliente que confia em nosso trabalho uma economia real, e uma ótima assistência durante, e no pós-venda. Além disso, aliamos a preocupação com o meio ambiente a um ótimo investimento para cada família atendida por nós, tendo em vista as novas preocupações atinentes ao nosso público.
PVS - Quantos projetos já executaram desde o início das atividades?
JANJ - Temos cerca de 350 projetos concluídos e aproximadamente mais 100 em andamento, destes, 85% são no estado de Sergipe e os demais estão espalhados pelo Nordeste, na Bahia, Alagoas, Pernambuco e Paraíba. Temos presença nesses cinco estados.
PVS - Tem ideia de quanto de energia é gerado para o estado de Sergipe através dos projetos que vocês executaram?
JANJ - Dentro desses três anos e meio de operação, as usinas que a Inovar conectou em terras sergipanas já geraram 5.5 GWh, o que equivale a aproximadamente, o abastecimento mensal de mais de três mil residências populares de Sergipe.
PVS - Em relação ao custo x benefício: qual a proporção de economia que a energia solar causa? poderia exemplificar?
JANJ - Em anos anteriores conseguíamos reduzir até 95% da conta de energia, porém hoje em dia, devido a inclusão de novos impostos e taxas para custear a complexidade do nosso sistema elétrico, essa redução perdeu um pouco de expressividade. Ou seja, uma residência que hoje paga R$ 300 de energia, ao colocar energia solar projetada de forma correta, atendendo os critérios técnicos e da concessionária de energia, passa a pagar R$ 85 de conta. De forma semelhante um comércio, que tem uma conta hoje de R$ 1000, passaria a pagar mais ou menos R$ 160, claro que isso tem variação a depender da cidade e perfil de consumo de cada cliente, o que acaba sendo avaliado após entender a necessidade de cada projeto.
PVS - Embora seja algo que vai baratear custos, implantar energia solar não é indicado para todo mundo/empreendimento, correto? Qual seria, por exemplo, a necessidade que justificaria a implantação desse sistema, principalmente no quesito residencial?
JANJ - Sim, certamente. Porém se o cliente tiver uma conta que pague mais que o mínimo (a chamada taxa da concessionária), ele já começará a economizar se tiver energia solar. Relacionado à viabilidade do investimento, ele começa a ser atrativo quando essa conta é de pelo menos R$ 200. Outro critério é espaço para instalação das placas, seja no local que tenha o consumo ou em outra instalação que esteja na área que a mesma concessionária atenda. Um exemplo disso, no nosso estado, é entre ENERGISA e SULGIPE, pois conforme legislação, não podemos compensar de uma para outra concessionária. E um último exemplo é relacionado a condomínios residenciais, com torres e vários apartamentos. O dono de um apartamento, por exemplo, não consegue colocar um projeto ali, pois não tem “telhado”. Nesses casos, o apartamento só pode receber créditos de uma outra usina, e a instalação no condomínio é feita para abater a conta das áreas comuns, como guarita, piscina, salão de festas etc.
PVS - Existe muito a ideia, principalmente com relação ao sertão nordestino, de que o sol é quase que um castigo. Mas ele seria um impulsionador do desenvolvimento, não é mesmo?
JANJ – Sim. De maneira bem simples, quanto maior a irradiação solar do local, maior a geração obtida por um sistema de energia solar Porém outros critérios são essenciais para que essa geração tenha viabilidade, e um dos principais é a disponibilidade da rede da concessionária. Já tem estado cuja concessionária de energia não está mais recebendo a geração de novas usinas por não ter estrutura de rede. Caso não haja planejamento, essa situação poderá acontecer em qualquer lugar do Brasil, inclusive aqui no nosso estado.
PVS – Há algo sobre o tema que você queira ressaltar?
JANJ - A energia solar chegou para ficar, e no Brasil, pela generosidade divina, temos condições muito favoráveis para sua implementação. O que está acontecendo, e deverá acontecer com mais intensidade, é a modificação em sua estrutura. Futuramente, a maioria dos sistemas poderá ter baterias, poderá ter dispositivos cada vez mais inteligentes para fazer uso da rede mais corretamente. A utilização de mais e mais carros elétricos em nossas ruas também contribuirá para a necessidade de novas fontes de energia, e sabemos que essas fontes precisam ser renováveis, não poluentes, como é o caso da energia solar fotovoltaica.
Brasil na dianteira da produção
de energia limpa no mundo?
O coordenador da ABSOLAR, Luzer Oliveira, faz questão de salientar que o Brasil é um país geograficamente muito privilegiado, e que possui cerca de 81% da matriz energética oriunda de fontes renováveis: 50% da hídrica; 18,1% solar; e 12,7% eólica.
Diante desses dados, ele afirma que no Brasil:
> Não terá escassez na geração de energia, e muito menos dependência de outro país para gerar energia para nós;
> Com tamanha capacidade renovável, o país consegue facilmente liderar o mercado de energia mundial;
> Existe a capacidade para ter a energia mais barata do mundo, e assim, atrair muito investimento para o país, a exemplo de indústrias que tenham a energia como principal insumo. Consequentemente, aumentaria a geração de emprego e renda, e o desenvolvimento econômico e social;
> Desde 2012 houve a geração de mais de 400 mil empregos no setor de energia solar no país;
> A seca torna o recurso hídrico escasso, aumentando o risco de ocorrência da bandeira vermelha na conta de luz da população. Quanto mais energia solar, menos água consumida para gerar energia, e mais alívio nos sistemas de transmissão;
> O desenvolvimento de geração própria solar alivia o orçamento das famílias brasileiras, gera emprego, e fortalece o setor produtivo.
SOBRE A ABSOLAR
A Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR) é a principal entidade do setor, e atua desde 2013 reunindo todos os elos da energia solar fotovoltaica e de outras fontes renováveis, além de armazenamento de energia e de hidrogênio verde. Possui associados nacionais e internacionais de todos os portes, e é, ainda, fonte de informação e ajuda na transição energética sustentável do país
Os bons ventos do desenvolvimento
Enquanto a produção de energia solar fotovoltaica acontece nos 75 municípios sergipanos, em um, especificamente, a energia limpa também é produzida por outra matriz: o vento. Estamos falando da Barra dos Coqueiros, distante cerca de cinco quilômetros de Aracaju, local com população estimada pelo IBGE (2022) em 41.515 pessoas; com extensão territorial de 92,268km²; e um PIB per capita de R$ 82.114,31 (em 2010 esse valor era de R$ 11.929,75, números também do IBGE).
Foi esse pequeno paraíso com vasta extensão de terra banhada pelo mar, que em 2012 foi montado o Parque Eólico Barra dos Coqueiros, com capacidade instalada de 34,5 MW e produção anual de 92 GWh.
Composto por 23 turbinas eólicas (com 100 metros de altura cada) com uma capacidade instalada de 1,5 MW cada, o parque ocupa área de 300 hectares, e os aerogeradores alojados nas torres prendem a atenção de quem trafega pela rodovia estadual SE-100, tanto pelo tamanho, quanto pela paisagem que compõem.
Ele é um dos 38 parques eólicos da transnacional Statkraft no Brasil, e que estão localizados nos estados de Sergipe, Bahia, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul. Exceto o da Barra dos Coqueiros, os demais parques estão agrupados em complexos eólicos, perfazendo sete, no total.
A Statkraft é uma empresa global em operações no mercado de energia, líder em energia hidrelétrica internacionalmente, e a maior geradora de energia renovável da Europa, com mais de seis mil funcionários em mais de 20 países. No Brasil, controla 40 ativos de geração de energia eólica e hidrelétrica, com 2.2 GW de capacidade instalada, entre operações, aquisições e projetos em construção.
Os estudos para implantação do parque tiveram início em 2008. As obras começaram em 2011 e a instalação das turbinas, em abril de 2012. O local foi inaugurado em 2013.