Ingestão de óleo essencial pode causar graves danos à saúde

17/07/2020


Saúde e bem-estar. Quem não quer estas duas palavrinhas incorporadas ao cotidiano de uma forma “palpável”, ou seja, dias felizes, sem doenças de qualquer tipo e grau de intensidade, nem mesmo uma unha encravada, e com disposição para correr meia maratona, enfim, com vitalidade e longevidade? Creio que ninguém, ou quase ninguém diria não querer estes presentes divinos.

E, justamente por saber que o ser humano faria qualquer coisa para ganhar este bilhete premiado, consultores de uma empresa que trabalha com óleos essenciais estão prometendo a cura ou auxílio na cura de diversas doenças, algumas delas graves, como o câncer, apenas com o uso de óleos essenciais e, pior ainda, com a ingestão de alguns deles.

Em um breve passeio pelos stories de influenciadores digitais foi possível encontrar alguns deles indicando a colocação de óleos em misturas de suco verde ou ingeri-lo até mesmo puro, para, por exemplo, combater a enxaqueca. Também por meio do Instragram encontramos um IG chamado de Curso de Óleos Essenciais e para o qual nos inscrevemos. O curso acontece pelo WhatsApp e nele, dentre as várias informações passadas aos pouco mais de 120 participantes ativos, estão: vamos te ensinar a como montar seu protocolo diário; como utilizar os óleos essenciais em suas receitas; como fazer alguns cosméticos de uso diário como shampoos, desodorantes, sabonetes líquidos; e como usar em total segurança em gestantes e crianças.

Os consultores informam que 90% dos óleos da marca que comercializam podem ser ingeridos e colocam até imagens desestimulando o uso de medicamentos alopáticos e incentivando a troca deles pelos óleos. “Assim como não são todas as plantas que podemos fazer chá, não são todos os óleos que podem ser ingeridos. É bom sempre consultar a pessoa que te vendeu, que está te acompanhando... No Brasil não existe nenhuma marca, além da nossa, que tenha essa certificação internacional e que garante que pode usar por meio de ingestão. Aqui, procuramos saúde e bem-estar”, informou a moderadora do grupo de WhatsApp. Este é apenas um, dos vários momentos em que o uso oral de óleos essenciais é incitado.

Procurada, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) informou, por meio da Assessoria de Comunicação, que a empresa/marca cujos consultores/vendedores apresentam os produtos como verdadeiros milagres que podem ser utilizados de forma tópica, pela ingestão e por inalação possui autorização de funcionamento para importar, expedir, distribuir e armazenar cosméticos, e que esta “não poderia fabricar ou importar medicamentos”. Sim, óleos essenciais podem ter indicação terapêutica e, neste caso, passam a ser medicamentos, mas, para tanto, devem ser regularizados como medicamento ou produto para saúde junto à Anvisa.

“Se está sendo usado com indicação terapêutica e não tem registro como tal na Anvisa, está irregular”, reforça a Ascom do órgão de vigilância e controle. Ela informou, ainda, que a empresa em questão possui vários óleos essenciais regularizados como “cosméticos isentos de registro”, portanto, não podem ser usados com apelo terapêutico ou serem ingeridos.

O apelo terapêutico em questão seria a aromaterapia, que, de acordo com a Anvisa, é aceito em cosméticos desde que esteja associado a descrições como “auxilia” ou “ajuda” no relaxamento, na redução do estresse diário e a minimizar as tensões do cotidiano, não sendo permitidas indicações para tratamento de doenças. “É importante esclarecer que a simples presença de ‘aromaterapia’ na rotulagem não configura ‘indicação terapêutica’”, reforçou a Agência.

PROBLEMAS À VISTA

Para a Dra. em Ciências da Saúde e coordenadora do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Tiradentes, Adriana Karla de Lima, que faz pesquisas envolvendo óleos essenciais e possui experiência em assistência farmacêutica e farmacologia de produtos naturais, os óleos essenciais não devem ser ingeridos por via oral, pois, devido à alta concentração das substâncias das quais foram originados podem causar intoxicação grave ou até ser placebo, uma vez estes princípios ativos podem não ser levados para a corrente sanguínea, sendo degradados ainda no estômago. Já pela inalação sem a orientação adequada e, se usado muito puro, esse tipo de óleo pode deprimir ou excitar o Sistema Nervoso Central e até causar convulsões.

Dra. Adriana Karla de Lima

“A Anvisa não atesta a utilização de óleos essenciais por via oral, e mesmo em produtos cosméticos para massagem ou tratamento de pele, por exemplo, eles não são colocados de forma pura, tem que haver diluição com algum óleo fixo/vegetal e, mesmo assim, antes da liberação são feitos testes toxicológicos, pois, óleo essencial puro tem grande potência e a concentração dele precisa ser controlada para evitar, por exemplo, lesões graves ou irritação. Infelizmente as pessoas estão sendo muito enganadas ao pensarem que qualquer óleo que está no mercado, mesmo os que levam o nome, são óleos essenciais. Primeiro, óleo essencial puro é caríssimo, e o que está em comercialização é uma mistura de óleo fixo, que é neutro, com uma quantidade do essencial para dar o aroma”, explicou a Dra. Adriana Karla de Lima.

Ela comentou, ainda, que o alto valor econômico do óleo essencial dá-se pela necessidade de grande quantidade da planta aromática que o originará. Seria uma proporção, em alguns casos, de dez quilos da planta para menos de cinco gotas de óleo essencial, uma vez que esta substância está presente em pequenas quantidades, e pode ser extraído de folhas, flores, caules, sementes, raízes ou casas.

PS.:

O nome da empresa não foi citado porque a intenção dessa matéria é fazer com que a população tenha conhecimento de que óleo essencial não deve ser utilizado de qualquer forma, e que, para uso terapêutico, ou seja, para agir como “medicamento” deve estar liberado pela Anvisa e ser prescrito por médico. Estando o produto liberado pela Anvisa, esta informação constará no rótulo da embalagem.



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