Óleo que invadiu litoral nordestino ameaça peixe-boi Astro
09/11/2019
Por Andréa Moura
Depois de ter conseguido sobreviver às redes de pescadores, às hélices das embarcações marítimas, às bebidas alcóolicas e comidas inadequadas oferecidas por humanos, o peixe-boi Astro enfrenta, aos 28 anos de idade, mais um grande obstáculo à sobrevivência: o derrame de petróleo cru no litoral nordestino. Esse desastre ambiental, de causas e proporções ainda desconhecidas, já alcançou o habitat dele, que são os estuários dos rios Vaza-Barris - próximo à ponte Joel Silveira, e nas Praias do Saco e Caueira, em Sergipe; e Rio Real, na região baiana de Mangue Seco, e tem impregnado o principal alimento da espécie: os bancos de capim agulha.
Esta situação tem preocupado demasiadamente João Carlos Gomes Borges, coordenador do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho, e toda a equipe que integra o programa, composta por cerca de 25 profissionais. Dentre as funções dessas pessoas, além de tentar manter Astro a salvo por meio deste monitoramento mais intenso, também estão a realização de ações de educação ambiental nas comunidades de Alagoas, Sergipe e Bahia (mais precisamente em Mangue Seco, onde há uma base), desenvolvimento de tecnologias – a exemplo do equipamento de radiotelemetria que permite saber a localização exata de Astro, por meio de satélite, mesmo que de forma remota - e oferecer suporte às equipes localizadas nos estados de Pernambuco e Paraíba.
O perigo que o mamífero aquático mais famoso de Sergipe corre é real e foi constatado, de acordo com João Borges, quando detectou-se óleo na antena do equipamento que está no corpo do animal. Ao perceber esta interação, as equipes foram até Astro e fizeram alguns testes que comprovaram que, apesar da proximidade, a saúde dele estava “ok”.
“Claro que estamos preocupados, e muito, com tudo isto que está acontecendo. Embora o período mais crítico, no que diz respeito à quantidade de óleo encontrado, tenha sido nos primeiros dias de outubro e, atualmente, essa quantidade tenha reduzido bastante e os estuários dos rios onde ele fica estejam mais limpos, nossa apreensão reside no fato de termos achado óleo nos bancos de capim-agulha onde ele costuma se alimentar”, observou o coordenador do projeto. O peixe-boi é um animal herbívoro e o campim-agulha é a principal alimentação de Astro.
João Borges também informou que as equipes estão prontas para, a qualquer sinal de mudança no quadro clínico do animal, recolhê-lo e leva-lo para piscina em cativeiro. Este é um programa com custo elevado, que tem sido financiado pela Fundação O Boticário e pela Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental.
SOBRE ASTRO
Nascido em 1991, o peixe-boi Astro foi reintroduzido à natureza em 1994, no município alagoano de Paripueira. Porém, ele decidiu procurar outro local para chamar de “casa” e, nesta procura, acabou dividindo a moradia entre os estados de Sergipe (onde chegou no ano de 1998) e Bahia, mais precisamente no município de Jandaíra, na região de Mangue Seco, no estuário do Rio no estuário do Rio Real. No lado sergipano, o encantamento aconteceu pelo estuário do Vaza-Barris, por isso, ao longo desses 21 anos de residência pelas bandas de cá, ele sempre foi visto entre as praias da Cueira, em Itaporanga D’Ajuda, e Saco, pertencente ao município de Estância, ou ainda, onde atualmente é a ponte Joel Silveira, que “divide” os municípios de Itaporanga e Aracaju.
Pesando cerca de meia tonelada, Astro é um animal extremamente dócil e que gosta do contato com o ser humano. Este temperamento já é próprio da espécie e no caso específico de Astro, pode ter sofrido influência do tempo que ficou em cativeiro. Essa amabilidade já o colocou em grandes enrascadas, pois, graças à má-educação do ser humano, ele recebeu diversos tipos de bebidas alcóolicas e comidas que, claro, fazem mal ao animal. Outra preocupação constante para quem cuida de Astro é o fato de ele estar próximo à embarcações, pois, já foi vítima de alguns acidentes. Graças ao trabalho de educação ambiental realizado ao longo dos anos, estas ocorrências negativas foram bastante reduzidas, como informou João Borges. “Mas, cada chegada de verão a apreensão aumenta”, comentou.
Historicamente, Astro é único por essas bandas, embora já tenha existido relatos de que fora visto outro macho na região da Praia do Peba/AL, na foz do São Francisco, porém, nada confirmado. Quando ele foi solto em meio à natureza não estava sozinho, Lua, uma fêmea, também foi reintroduzida e já gerou filhotes, só não sabe-se se Astro é o pai, até porque ela não fez a mesma escolha de rota que o antigo companheiro de jornada. E, por falar em companheirismo, é bem provável que os precursores do Programa de Manejo para a Conservação de Peixes-boi no Brasil do ICMBio/MMA ganhem novos amigos, pois, entre os dias 23 e 24 de novembro, na Paraíba, haverá a soltura de mais dois animais. (Fotos - Divulgação - Projeto Viva o Peixe-boi Marinho)