Pandemia: líder do governo afirma que situação do Brasil é confortável

18/03/2021


Por Andréa Moura

Na manhã desta quarta-feira, 17 de março, menos de 24h após o Brasil registrar a maior marca de mortos por Covid e, toda a pandemia, 3.299 (contando com os 501 óbitos no Rio Grande do Sul ocorridos no dia 16 de março e que só foram informados pela secretaria da Saúde do RS hoje), o ex-ministro da Saúde do governo Michel Temer (MDB) e atual líder do governo Bolsonaro na Câmara, o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), disse que a situação do Brasil na pandemia “não é tão crítica assim se comparada a de outros países, ela é até confortável”. A declaração foi dada durante entrevista ao telejornal “Em Ponto”, na Globonews. Roberto Barros foi ministro da Saúde de maio de 2016 a abril de 2018.

“Repare bem na estatística de mortes por milhão, que significa o cuidado do sistema de saúde para com as pessoas: no Reino Unido são 1.853 mortes/milhão e ocupa o 4° lugar; nos Estados Unidos são 1.609 e ocupa o 11° lugar; no Brasil são 1.314 mortes/milhão e estamos no 22° lugar, então, o nosso sistema de saúde está melhor no tratamento de pessoas do que a da maioria dos países de primeiro mundo que estão à nossa frente em número de vacinados. Embora tenha começado mais tarde já são 10.300.000 vacinados e 11.600.000 que já pegaram a Covid-19 e estão imunes, então, a nossa situação não é tão crítica assim se comparada a de outros países, ela é até confortável”, afirmou o líder do governo na Câmara.

Por volta das 23h desta quarta-feira (17/03), de acordo com o levantamento do painel interativo para rastrear a Covid-19 no mundo em tempo real, da Johns Hopkins University (JHU), o Brasil tinha 284.775 mortes em decorrência da doença e o total de 11.693.838 de casos registrados, ocupando o segundo lugar geral no ranking mundial, perdendo apenas para os Estados Unidos, que registravam 537.992 mortes e 29.604.448 casos confirmados.

A declaração com visão distorcida da realidade foi dada quando o parlamentar fora solicitado a falar sobre a mais recente pesquisa Datafolha sobre o desempenho da gestão da pandemia pelo governo Jair Bolsonaro, que foi apontado por 54% dos entrevistados como ruim ou péssimo. De acordo com o deputado federal, não era esperado este “repique” de casos. “Não esperávamos ter esse aumento de casos, que acontece mundialmente, agora, com o sistema de leitos de UTI mais estruturados e, ainda assim, temos tido em alguns lugares o esgotamento da rede”, disse Ricardo Barros.

ANVISA NA BERLINDA

Ainda durante a entrevista, ele criticou a OMS ao afirmar que ela mudou algumas vezes o direcionamento de como proceder ao longo da pandemia e que agora, inclusive, estaria questionando o lockdown. Disse, ainda, que além das três vacinas com uso autorizado (emergencial ou definitivo) pela Anvisa para utilização no País, existem praticamente dez vacinas compradas pelo Ministério da Saúde por contratos de entrega aguardando aprovação da Agência, vacinas que, segundo ele, são usadas largamente em outros países. “E no Brasil, não!”, disparou o deputado federal.

Porém, no site da Anvisa, no painel que demonstra o andamento da análise de registro e uso emergencial das vacinas, e aponta a porcentagem relativa ao status da submissão de cada um dos relatórios, além das informações necessárias à análise de autorização, estão apenas cinco pedidos: da Astrazeneca, do Butantan, da Fiocruz, da Pfizer e da Janssen, sendo que a vacina da Johnson & Johnson é a única que, até o momento, não solicitou o uso emergencial do imunizante. “A documentação tem sido avaliada como parte do processo de submissão contínua”, informa o órgão federal de controle e fiscalização na página.

Roberto Barros falou, ainda, que espera que o médico cardiologista Marcelo Queiroga, cotado para ser o novo ministro da Saúde - que ainda não foi empossado, mas, atua como se já tivesse recebido a ‘pasta’ – consiga agilizar a entrega das vacinas já compradas, mais de 500 milhões de doses, segundo ele. “Esperamos que a Anvisa acelere a sua aprovação e consiga adiantar as entregas ou, pelo menos, evitar atraso, e até julho teremos os 77 milhões do grupo prioritário do Brasil vacinados”, concluiu o parlamentar.

DECLARAÇÕES EQUIVOCADAS

Dr. Diego Tanajura - Foto Ana Clara Abreu

Para o Doutor em Patologia e Especialista em Vacinas, Diego Moura Tanajura, que é professor da Universidade Federal de Sergipe, é um absurdo ouvir de um representante do povo que a situação do Brasil na pandemia não é tão crítica assim e que seria até confortável, porque isso é uma inverdade. Segundo ele, estaríamos em situação confortável se o cenário local fosse ao menos parecido com o de Israel, onde cerca de 60% da população já foi vacinada e os números de casos e mortes têm caído.

“O Brasil está longe de uma situação confortável, basta olhar o panorama atual, com hospitais lotados, tanto na rede pública quanto privada, e pacientes morrendo à espera de leito”, observou. De acordo com matéria da BBC News Brasil, Israel administrou 109,66 doses contra o coronavírus para cada 100 pessoas, enquanto aqui, essa relação é de 5,6 doses para cada 100 habitantes. Dr. Diego Tanajura também afirmou que o número de pessoas que já tiveram a Covid-19 e se curaram não deve se somado ao de imunizados após recebimento da vacina, porque não há certeza do tempo de duração da proteção advinda do contágio, como insinuou o parlamentar.

A incerteza quanto a não reinfecção reside, principalmente, pelo fato de haver três variantes em circulação no mundo, fato que tem preocupado a Organização Mundial de Saúde (OMS): a P1 (originária no Brasil, em Manaus), a sul-africana e a britânica, que já circulam, inclusive, no País. “Existem trabalhos mostrando que pessoas que pegaram a Covid-19 podem ser reinfectadas pelas novas variantes, isso com relação à sul-africana e à brasileira. Então, não dá para garantir que quem teve Covid-19 e se curou estará protegido. Também existem trabalhos mostrando que os anticorpos gerados em quem já teve a doença podem ser incapazes de proteger contra as novas variantes, pois, elas teriam a capacidade de fugir da nossa resposta imune”, explicou Dr. Diego Tanajura.

Por fim, o Dr. em Patologia e Especialista em Vacinas julgou como simplista a afirmação do líder do governo na Câmara ao dizer que o Brasil estar na 22ª posição mundial, no comparativo de mortes por milhão de habitantes, seria a prova de que o sistema de saúde brasileiro é melhor no tratamento dos cidadãos “atingidos” pelo novo coronavírus, do que outros países de primeiro mundo que já teriam vacinado um percentual maior das respectivas populações.

“Esta não é uma avaliação totalmente correta. Sabemos que a maior quantidade de mortos por esta doença tem sido de idosos e o Brasil tem até uma população jovem, em comparação com países da Europa, por exemplo. Se os cálculos forem feitos ajustando os números para a quantidade de idosos que temos em nossa população, a posição do Brasil no ranking acabaria subindo”, informou o professor da UFS.



Comentários

Nenhum Resultado Encontrado!

Deixe um Comentário

Nome
E-mail
Comentário