Pesquisadora ganha prêmio por transformar casca de sururu em matéria-prima para insumo da Construção Civil
15/04/2019
O que fazer com quatro toneladas diárias de um resíduo rico em Cálcio, Magnésio e Fósforo, que pode ser reaproveitado para além do artesanato, mas que tem sido descartado no aterro sanitário da cidade de Maceió/AL? Foi esta a pergunta que a Dra. Janaína Accordi Junkes, pesquisadora do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP), da filial Maceió/AL, decidiu responder ainda em 2018 ao utilizar a casca do sururu como insumo para a construção de um tijolo ecológico. Os estudos foram realizados em conjunto com os então alunos do curso de Engenharia Civil do Centro Universitário Tiradentes, /AL, Amanda Tenório e Paulo Chagas.
As pesquisas científicas comprovaram que a mistura da trituração da concha deste molusco - que é uma das principais iguarias da culinária alagoana -, associada a alguns outros insumos resulta em um tijolo altamente resistente e com ganhos para o meio ambiente. De acordo com a publicação “A cada lata: a extração do sururu na lagoa Mundaú”, confeccionada em 2014 pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade (IABS) em conjunto com a Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, e o Governo do Estado de Alagoas, para obter um quilo de carne de sururu, a depender do período do ano, são necessários entre oito e 20 quilos do molusco in natura, ou seja, com casca.
De acordo com a pesquisadora, dentre os benefícios sociais e ao meio ambiente que o uso da casca do sururu na confecção de tijolos ecológicos vai gerar estão: a redução dos resíduos resultantes da cata do marisco; geração de emprego e renda para as famílias que sobrevivem da atividade marisqueira e que possuem baixa condição econômica; e, por não haver, como nas olarias tradicionais, a queima do tijolo, o processo não lança poluentes para a atmosfera em consequência da incineração de madeira. “É uma produção extremamente limpa, pois, não gera resíduos”, comentou a pesquisadora.
A ideia do desenvolvimento deste material para a Construção Civil foi tão bem aceita que a pesquisa, coordenada pela Dra. Janaína Junkes, foi uma das selecionadas pelo IABS para integrar o ‘Projeto Maceió mais Inclusiva através de Modelos de Economia Circular’ por meio do processo seletivo do “Estudo da utilização de resíduos e subprodutos das cadeias produtivas do sururu e da pesca, como base para novos produtos e atividades baseados no conceito de economia circular”.
Por ter sido selecionada, a pesquisa receberá financiamento de R$ 25 mil para a conclusão dos estudos e comprovação da formulação. O recurso será destinado para a compra dos equipamentos necessários para fazer as análises e testes, que acontecerão no Laboratório de Análises Ambientais do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (LAnA/ITP).
OS BENEFÍCIOS DA DESCOBERTA
“É importante explicar que não iremos construir os tijolos para escala comercial. O que faremos é o desenvolvimento da formulação que foi iniciada durante o TCC dos meus alunos e que agora, segue como projeto de mestrado de um deles. Depois, patentear a descoberta e disponibilizar a tecnologia para que possa ser produzida em escala industrial”, explicou a pesquisadora do ITP.
Segundo ela, algumas diferenças que existirão entre o tijolo convencional e o ecológico que será desenvolvido no LAnA são: o tradicional possui seis furos, é queimado, tem peso aproximado de dois quilos e necessita de muito cimento para a montagem de uma parede, por exemplo. Já o ecológico possui dois furos, não precisa de queima para chegar ao ponto de uso, tem peso de 3.2 kg e usa pouquíssimo cimento para a montagem de uma parede, pois esta será feita por encaixe, estilo peças de lego.
Um relatório parcial de projeto para reaproveitamento da casca do sururu, feito pela Superintendência de Limpeza Urbana da prefeitura de Maceió, em 2017, revelou que as cerca de quatro toneladas de sururu catadas na Lagoa do Mundaú, no bairro Vergel do Lago, são produzidas por aproximadamente 300 famílias de marisqueiras da região, gente que lida, diariamente, com uma série de dificuldades de ordem social e econômica e, por isso, acabam exercendo atividades informais e de subsistência em um ambiente precário, como apontou a publicação feita pelo IABS, em 2014.
O relatório da prefeitura de Maceió mostrou, ainda, que por ser rica em Cálcio, Magnésio e Fósforo, a concha do molusco pode ser usada como fertilizantes, indutores de compostagem, condicionador de solo e ração para animal, porém, por falta de materiais e equipamentos para beneficiamento, esse possível dinheiro está indo para o lixo, uma vez que as cascas continuam sendo recolhidas pelo serviço de limpeza urbana e descartadas no aterro sanitário.
A possibilidade de oferecer condições dignas de sobrevivência para as famílias marisqueiras, por meio do beneficiamento da casca do sururu, é algo que deixa a Dra. Janaína Junkes muito feliz.
Ela confessa que desde 2014, quando iniciou as pesquisas de campo pelo Vergel do Lago em busca de dados e insumos para outras pesquisas, sempre saía da localidade triste porque as pessoas lhes pediam ajuda para mudar a realidade vivida. “Cada ida à região sentia uma dor no coração porque não podíamos fazer muito por eles. Agora não! Temos a perspectiva real de ajuda-los a transformar a história que possuem, a serem autossustentáveis através daquele produto que conhecem tão bem, mas que sempre jogavam no lixo. Estou imensamente emocionada, satisfeita com a aprovação do projeto e entusiasmada para ver, mais uma vez, o resultado de uma pesquisa científica mudar, para melhor, a vida das pessoas”, declarou.
Para o Dr. Diego Menezes, presidente do ITP, este é um exemplo claro da concretização da missão institucional, que é de contribuir, por meio do desenvolvimento científico e tecnológico, para a mudança de realidades locais por meio de produtos e processos de maior valor agregado e gerador de inserção social, que não esconde a felicidade em já visualizar os frutos da mais jovem filial do ITP.