Ministérios Públicos acreditam em subnotificação de casos suspeitos de COVID-19 em SE
03/04/2020
Por Andréa Moura
A suspeita de que esteja havendo subnotificação dos números da COVID-19 em Sergipe levou os Ministérios Públicos Federal, do Trabalho e do Estado de Sergipe a produzirem, conjuntamente, o Ofício n° 187/2020, onde está contida a Recomendação n°009/2020, que tem como objetivo “a correção da subnotificação de casos suspeitos de Covid-19 em todo o estado de Sergipe, na rede pública e privada, ao Ministério da Saúde; transparência e efetivo mapeamento da disseminação do coronavírus no Estado; alteração do protocolo estadual de testagem para a doença para, ao menos, realização nos casos prioritários recomendados pela OMS”.
O documento foi enviado no dia 30 de março para o governador do Estado e o secretário da Saúde de Sergipe, e para os prefeitos e secretários municipais de Saúde dos 75 municípios sergipanos. Diante da urgência e gravidade da situação, ficou concedido aos destinatários o prazo de três dias, contados a partir do recebimento da notificação, para que informem sobre o acatamento da Recomendação e as medidas que foram adotadas para o cumprimento da mesma. Caso todos tenham recebido a notificação no mesmo dia, o prazo seria encerrado nesta quinta-feira, dia 2 de abril.
No documento encaminhado aos gestores estão descritas as constatações apuradas pelo Inquérito Civil nº 1.35.000.000306/2020-47, que versa quanto à situação da subnotificação de casos suspeitos de Covid-19 em Sergipe, com consequências graves para o efetivo monitoramento da disseminação da pandemia na população sergipana, e a aferição da demanda da rede de assistência à saúde que será enfrentada em razão da pandemia.
Os MP’s recomendam aos gestores citados que realizem, promovam e orientem a notificação compulsória de todos os suspeitos da doença, inclusive os casos de Síndrome Gripal (SG) e de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) de acordo com os protocolos e definições do Ministério da Saúde, ao Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (CIEVS) da Secretaria de Estado da Saúde (SES), independente de onde tenha ocorrido o atendimento, ou seja, se em unidade pública ou privada. As notificações compulsórias deverão ser viabilizadas a todos os municípios sergipanos e feitas logo em seguida ao surgimento da suspeita clínica.
COMUNICAÇÃO COM A POPULAÇÃO
A rede de assistência deve receber a orientação de que os indivíduos com sintomas da SG ou SRAG serão considerados casos suspeitos de Covid-19, ainda que sem a realização de testes, caso a capacidade de testagem em Sergipe esteja limitada. É recomendado ao governo do Estado que amplie a rede sentinela com acesso ao sistema para notificação de casos suspeitos para todas as unidades básicas de saúde e secretarias municipais do interior, disponibilizando canal de comunicação acessível ao público similar ao número 156 (da prefeitura de Aracaju), também para o interior sergipano, e viabilizando o fluxo de informações também na rede privada de assistência à saúde.
Os integrantes dos Ministérios Públicos determinam que o Estado deverá realizar “o imprescindível reforço de capacitação dos técnicos dos municípios nos fluxos epidemiológicos e operacionais, na emissão de alertas e orientações às secretarias municipais de Saúde que, por sua vez e nos moldes das ações instituídas em âmbito estadual, devem manter alinhados os fluxos de atuação com as orientações da Secretaria de Estado, orientando, inclusive, as equipes de saúde no monitoramento epidemiológico dos casos”.
O protocolo que será adotado para a ocorrência de óbitos naturais indefinidos e não testados, relacionados a insuficiência respiratória para fins de registro e mapeamento epidemiológico de mortes suspeitas por Covid-19, é outra ação que deve ser informada ao grupo de Procuradores da República e Promotores de Justiça. Há, ainda, recomendação para que seja editada nova Nota Técnica regulamentando a Notificação Compulsória de casos suspeitos de COVID-19, adequando-a aos protocolos vigentes do Ministério da Saúde, e atendendo aos termos da Recomendação 009/2020 com as adequações que se mostrarem necessárias para a realidade local.
É para ser feito amplo trabalho de orientação e divulgação junto aos profissionais da saúde de laboratórios, clínicas e hospitais, independentes de serem das redes públicas ou privadas, de que eles deverão realizar a devida notificação compulsória dos casos suspeitos e/ou confirmados de contaminação pelo coronavírus. A não notificação pode incorrer em pena de responsabilização. Para que todos fiquem cientes sobre este item, pode ser solicitada ajuda às entidades de classe, como CREMESE e COREN.
TRANSPARÊNCIA NOS NÚMEROS
O governo do Estado também deve ser mais explícito ao informar a quantidade de casos que estão ocorrendo em Sergipe. Ao realizar a publicação dos dados oficiais de casos confirmados, suspeitos e descartados, a população deve ser esclarecida de que os números referem-se, apenas, aos pacientes testados. A partir da regularização das notificações compulsórias recomendadas, devem ser informados, também, os casos suspeitos não testados, que devem ser devidamente monitorados pelas Vigilâncias Estadual e Municipais de todo o Estado, no âmbito das respectivas competências.
Tais solicitações surgiram com base na atuação do sistema de saúde em atendimento à Nota Informativa nº 01/2020 da SES, editada após o Ministério da Saúde declarar, em 20 de março do corrente ano, estado de transmissão comunitária em todo o país. A Nota atualizava os critérios para a realização de teste diagnóstico da COVID-19, que fora restringido a apenas três situações: casos de doença respiratória sugestiva de Covid-19 que se encaixem na definição de SRAG e/ou que necessitem de internamento hospitalar, independente da história de deslocamento ou contato com caso suspeito ou confirmado da doença; aos profissionais da Saúde que trabalham no atendimento direto aos casos suspeitos e/ou confirmados e que apresentem sintomatologia compatível; e nos casos identificados de forma amostral pelas unidades sentinelas definidas pela Secretaria de Estado da Saúde.
Desta forma, segundo os Ministérios Públicos, observa-se que a testagem não abrangem os pacientes que apresentam sintomas de Síndrome Gripal considerados leves e moderados, e que devem ser tratados como suspeitos da COVID-19, na fase de transmissão comunitária, e cuja notificação é mandatória segundo consta nos termos do “Protocolo de Manejo Clínico do Coronavírus (Covid-19) na Atenção Primária à Saúde1”, do Ministério da Saúde.
“Apontamos que nesta fase de transmissão comunitária do vírus a ausência de notificação oficial ao Ministério da Saúde, bem como a não divulgação do efetivo número total de suspeitos de Covid-19 (testados ou não), ou seja, todos os casos de Síndrome Gripal leves e moderados, somados aos de Síndrome Respiratória Aguda Grave, importa no descumprimento do Protocolo de Manejo Clínico do Coronavírus (Covid-19) na Atenção Primária à Saúde2, o que prejudica o mapeamento local e nacional da pandemia e, ainda, transmite à população equivocada sensação de que há poucos casos suspeitos no Estado, e que a situação estaria sob controle”, afirmaram os Procuradores da República, do Trabalho e o Promotor de Justiça que assinam o documento.
Eles concluíram que, diante de todos os fatos elencados está havendo subnotificação de casos suspeitos de Covid-19 informados ao Ministério da Saúde em todo o estado de Sergipe, tanto na rede pública como privada, e alertam que, desta maneira, deixa-se de identificar oportunamente os casos suspeitos de novo coronavírus e impede a adoção de medidas de isolamento precoce do paciente, de prevenção profissional, de prevenção populacional e, por via de consequência, de oportuna e obrigatória notificação, além de poder impactar negativamente o Estado no que diz respeito à distribuição de recursos federais, insumos e testes, caso haja utilização do critério do número de notificações. (Foto de Yves Herman, da Agência Brasil)